Em ação declaratória de inexistência de débito, alegação do Autor de não conhecimento da dívida deve ensejar litigância de má-fé

Em recente julgado da 16ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, de 18/05/2021, o Autor (consumidor) teve seu pedido negado e foi condenado ao pagamento de cinco salários mínimos por litigância de má-fé, ao ajuizar ação de declaração de inexistência de débito em face de uma instituição financeira.

Em outras palavras, através da Apelação Cível nº 1018825-63.2018.8.26.0577, pretendia o Autor que  fosse declarada pelo Judiciário a inexistência da dívida que acarretou a negativação de seu nome, buscando posteriomente a exclusão desta inscrição no SPC e no Serasa.

Ao apresentar sua defesa, em suma, a empresa prontamente apresentou o contrato que originou o débito, devidamente assinado pelo Autor, o qual, em seguida, se quer impugnou sua existência ou apresentou comprovante do pagamento do valor em aberto.

Após perder a ação em primeira instância e ser condenado por litigância de má-fé, o Autor apresentou recurso de apelação, reiterando essencialmente a alegação de desconhecimento do contrato e do débito. Aduz que, pela dívida ter sido objeto de cessão de crédito de outra empresa (da qual efetivamente contratou o serviço gerador do débito), para a então empresa Ré, sem ter sido notificado, não teria como ter ciência de sua existência.

Como já adiantado, em segunda instância seu pedido foi negado, mantendo-se a senteça outrora proferida em todos seu termos, inclusive quanto a condenação por litigância de má-fé, no valor de cinco salários mínimos. O entendimento dos magistrados foi de que, ao omitir o conhecimento da relação jurídica em questão, que veio a ser comprovada nos autos, não esteve o Autor em consonância ao princípio da boa-fé.

Fundamentam sua decisão, de maneira correta, salientando que o fato de alegar que “não recorda” de assinar o contrato, apenas corrobora para a convicção de que tenta o Autor, de forma ardil, fugir da condenação. Além disto, mencionam outros recentes julgados que apresentam o mesmo entendimento em casos similares, os quais têm acontecido com frequência.

Em levantamento feito pelo Idec (instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), em 2020 houve verdadeira “explosão” de reclamações sobre serviços financeiros, apresentando a ocorrência de “cobrança por serviço/produto não contratado/não reconhecido/não solicitado” um aumento de 441% em relação ao ano de 2019. Isto dentro do período da crise que assola o país, ou seja, coincidentemente no momento em que a população, de forma geral, está sem dinheiro.

Não é novidade que o número de ações judiciais contra instituições financeiras sempre foi, e ao que tudo indica, continuará sendo extremamente expressivo em comparação à maioria das outras demandas no país, na medida em que boa parte das reclamações mencionadas tendem a se tornar efetivamente processos judiciais.

Neste passo, cumpre ao Judiciário, como no caso relatado, estar atento à possíveis demandas que, eventualmente, estarão disfarçadas de justa motivação, nas quais os Autores buscarão obter vantagem de empresas fazendo uso de alegações ardilosas, especialmente de instituições financeiras.

Ainda que, por alguma exepcional razão, o consumidor verdadeiramente não se lembre da assinatura do contrato, e de eventual dívida em decorrência deste, antes de buscar o Poder Judiciário pleiteando por um direito que, portanto, não tem conhecimento, deve buscar entendimento prévio, contactando o credor, por exemplo. Além disso, por óbvio, é dever do cidadão ter conhecimento dos documentos que assina, tendo em vista que estará se sujeitando às condições daqueles termos, apresentando total concordância e manifestando sua ciência.

Desta maneira, é de fato muito importante este posicionamento mais “rígido” dos magistrados, se é que se pode assim chamá-lo, à frente de situações como do caso em relato. Com isso, há a propensão da gradativa diminuição do número de demandas nas quais o consumidor tenta levar o julgador ao engano, buscando criar situação em que possa tirar proveito em face das instituições financeiras. É o que se espera.

 

Acórdão nº 2021.0000375978

https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=14640105&cdForo=0

 

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