O tropeço do gigante

A Europa está em crise: por mais que a austeridade obsessiva de Angela Merkel faça sentido para seu povo, não há como forçar gregos, italianos, espanhóis e outros cidadãos europeus a pagar impostos e deixar de gastar tanto.

 
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A Europa está em crise. O berço da ciência moderna e fonte do iluminismo passa por dias de penúria. Stiglitz, em seu recente livro “The Euro: How a Common Currency Threatens the Future of Europe”, credita parcela da culpa por tal circunstância à moeda da União Europeia, o Euro. O alto índice de desemprego, pressionando os salários para baixo, além dos cortes no orçamento adotados por governos austeros, somam-se ao problema da moeda para castigar principalmente a classe média e os pobres, aumentando a desigualdade no continente.

Um agente pouco acostumado a sofrer com crises econômicas ou sociais desestabilizou o mercado financeiro europeu: o Deutsche Bank. Esse ícone do mercado financeiro balançou de maneira preocupante na última semana, amargando números terríveis em seus ativos, além de sofrer a ameaça de multa bilionária nos EUA por infrações durante a crise de 2008. A desconfiança fez cair o valor de seus papeis nas bolsas de valores. O caso é mais grave do que parece.

Criado em 1870 para financiar a indústria prussiana, o Deutsche Bank foi por muito tempo símbolo do desenvolvimentismo alemão, patrocinando a indústria conhecida mundialmente pela capacidade produtiva e tecnologia de ponta. Esse banco, porém, esteve recentemente metido em diversas confusões que em nada lembram sua história. O problema poderia até ser resolvido com a intervenção do governo alemão, não fosse o fato da patologia estar espraiada em todo o sistema financeiro europeu. Se o Deutsche Bank está enfiado numa grave crise, o que diria os demais bancos do bloco da UE, que nem sabem como virar o ano longe da bancarrota.

As trapalhadas do sistema financeiro europeu e, particularmente, de seu Banco Central, provocaram o tropeço do gigante. A União Europeia foi imobilizada por milhares de anões liliputianos, que nela lançaram, além da moeda artificial, as amarras da burocracia de Estado, da ineficiência agrícola, do protecionismo comercial, do alto custo público, do excesso de tributos, da indústria pouco competitiva, do bem estar social insustentável.

Tais amarras desequilibram o mercado comum europeu, esse gigante que tem o PIB dos EUA, mas que não consegue ser competitivo como seu rival e, ao que parece, ameaça cair tal qual no romance satírico do escritor irlandês Jonathan Swift. Os anões liliputianos podem tombar a União Europeia se nada for feito para liberá-la das amarras que tiram a mobilidade de seus membros, notadamente, os impostos em profusão e o alto custo dos estados membros.

Por mais que a austeridade obsessiva de Angela Merkel faça sentido para seu povo, não há como forçar gregos, italianos, espanhóis e outros cidadãos europeus a pagar impostos e deixar de gastar tanto, como bem observou o cronista Gilles Lapouge. O financiamento desses gastões exige malabarismos dos agentes do mercado financeiro, a pedalar enlouquecidamente em busca da estabilidade de todo o bloco, esse gigante que – Deus nos livre! – ameaça cair, levando consigo o mercado do mundo globalizado.

Créditos: Fernando Zilveti – Advogado e livre docente pela USP

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