O fantasma do impeachment

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Desde o impedimento do presidente Fernando Collor o risco de defenestramento do poder tira o sono dos mandatários de cargos do Executivo no Brasil. Após o conturbado julgamento de igual processo no caso de Dilma Rousseff, esse fantasma do impeachment voltou a assombrar, mas surgiram dúvidas sobre o poder e a cara do fantasma.

Em se tratando de via política de afastamento de mandato eletivo pode se dizer que motivação não faltou a ambos os casos Collor e Rousseff, ao menos sob a perspectiva do direito administrativo e constitucional. Os atos de afastamento com perda de mandato foram cercados da formalidade exigida, de modo que restaria aos sujeitos passivos dos processos conformar-se com as sentenças e se recolherem ao ostracismo, não fosse a manobra jurídica esdrúxula ensejada e acatada pelo presidente do STF no caso Rousseff.

O fatiamento da pena para a presidente faltosa, que a poupou da inelegibilidade por oito anos, criou mais do que um grave precedente. Pode significar a burla completa da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF no futuro. Os futuros governadores, prefeitos e até mesmo presidentes da república saberão que seus mal feitos farão apenas abreviar seus mandatos. Eles poderão, inclusive, voltar nas próximas eleições, nos “braços do povo”. Todo o processo de impedimento por crime de responsabilidade perdeu o sentido educativo, de compensar o dano causado ao cidadão pela imoralidade na administração.

A intenção do legislador ao elaborar a LRF foi moralizar as contas públicas, dar ao cidadão mecanismos de controle de gastos na execução de políticas públicas. A partir da LRF o cidadão não seria apenas um passageiro na condução da gestão pública, realizada por políticos eleitos pelo voto direto. A representação popular ganhou outro sentido, para não mais dar “cheque em branco” ao mandatário, com poderes para fazer o que quiser com os recursos provenientes dos tributos pagos.

A ideia do “no taxation without representation” tinha sofrido acréscimo na frase”…and without expendidure fiscalization”. Em outras palavras, o tributo precisa de lei para ser cobrado, mas a despesa controlada legítima a tributação recolhida do bolso do contribuinte. Trata-se da cidadania fiscal, que precisa de eficácia absoluta das leis que impõem responsabilidade aos administradores no trato da coisa pública. A meia pena significa um convite à reincidência.

Enfim, o sistema da responsabilidade depende de penas severas para se impor, que não precisam transformar pessoas em párias sociais, mas afastar os faltosos da vida pública por tempo suficiente para permitir a renovação da classe política, dando o exemplo aos novos administradores públicos. A ser mantida a decisão inconstitucional do Senado Federal o fantasma do impeachment se transformará num bicho papão, incapaz de meter medo sequer a uma criança.

Créditos: Fernando Zilveti – Advogado e livre docente pela USP

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