A recente reforma tributária sancionada pelo Governo Federal representa a mais significativa mudança no sistema fiscal brasileiro nas últimas décadas. O novo modelo, estruturado como um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual, visa substituir tributos federais, estaduais e municipais por um sistema mais racionalizado e eficiente. Entretanto, a transição entre os regimes exigirá um planejamento minucioso por parte das empresas, dada a complexidade dos ajustes operacionais e a necessidade de conformidade estrita às novas normas fiscais.
Com a promulgação da Lei Complementar nº 214/2025, inicia-se um período de transição que se estenderá de 2026 a 2033. Durante esse intervalo, as organizações precisarão operar sob dois sistemas tributários concomitantemente, o que acarretará desafios na parametrização de sistemas contábeis, na adequação de processos operacionais e no treinamento da equipe responsável pela apuração e recolhimento dos tributos.
Diante desse cenário, este artigo discute os principais aspectos da reforma tributária e apresenta estratégias que empresas de todos os portes podem adotar para garantir conformidade e mitigar riscos fiscais durante a transição.
1. Estrutura da Nova Sistemática Tributária
A reforma prevê a substituição de cinco tributos atuais por dois novos impostos, além da introdução de um tributo seletivo:
- Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS): tributo federal que substituirá PIS, COFINS e IPI, promovendo a unificação da tributação sobre bens e serviços no âmbito da União.
- Imposto sobre Bens e Serviços (IBS): imposto de competência estadual e municipal, que substituirá ICMS e ISS, reduzindo as disparidades de arrecadação entre entes federativos.
- Imposto Seletivo (IS): tributo extrafiscal aplicável a bens e serviços considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como produtos alcoólicos e cigarros. Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS): tributo federal que substituirá PIS, COFINS e IPI, promovendo a unificação da tributação sobre bens e serviços no âmbito da União.
A implementação ocorrerá gradualmente, conforme o seguinte cronograma:
- 2026: CBS e IBS começam a ser testados, sem recolhimento efetivo, com incidência simbólica nas notas fiscais e início do cumprimento das novas obrigações acessórias.
- 2027: A CBS passa a ser cobrada efetivamente, extinguindo PIS e Cofins, e o IS entra em vigor.
- 2029 a 2032: Redução progressiva das alíquotas de ICMS e ISS, com extinção total desses tributos em 2033.
- 2033: Implementação definitiva do novo sistema tributário.
Esse modelo visa assegurar um regime tributário mais transparente e menos complexo, além de reduzir a cumulatividade dos tributos, promovendo maior neutralidade econômica.
2. Principais Desafios para as Empresas na Transição
Embora a simplificação tributária seja um avanço estrutural para o ambiente de negócios no Brasil, a fase de transição entre os regimes impõe desafios significativos para as empresas. Os principais aspectos a serem considerados incluem:
- Gestão Tributária em Regime Paralelo: Durante o período de transição, empresas precisarão adequar seus sistemas para operar sob dois regimes tributários simultaneamente, o que demandará investimentos em tecnologia fiscal, integração de dados e controle contábil mais rigoroso.
- Revisão da Precificação de Produtos e Serviços: As novas alíquotas poderão alterar o custo final dos produtos e impactar as margens de lucro. Estratégias de precificação precisarão ser ajustadas de acordo com a nova carga tributária incidente sobre cada operação.
- Adaptação de Contratos e Compliance Fiscal: A migração para um novo modelo tributário pode exigir revisões contratuais, especialmente em operações de longo prazo. Além disso, o compliance tributário se torna ainda mais crítico para evitar penalidades decorrentes de erros na apuração e recolhimento dos tributos.
- Capacitação Técnica e Treinamento da Equipe: A complexidade da transição exige que profissionais das áreas fiscal, contábil e jurídica estejam plenamente capacitados para compreender e aplicar as novas normas, mitigando riscos operacionais e financeiros.
- Gestão de Riscos e Penalidades: O descumprimento das novas regras pode resultar em sanções severas, incluindo multas, autuações fiscais e bloqueio de ativos. A conformidade com os prazos estabelecidos pela legislação será essencial para evitar contingências tributárias.
- Adaptação do Fluxo de Caixa: A técnica do split payment será uma inovação, mas pode causar impacto no capital de giro da empresa, pois os tributos serão recolhidos automaticamente no momento da aquisição do bem ou do serviço. No contexto atual, o pagamento do produto acontece em um momento e o pagamento dos tributos posteriormente.
- Controle de Fornecedores: as empresas somente poderão tomar crédito do tributo que foi efetivamente pago na cadeia anterior, ou seja, para assegurar que os créditos poderão ser utilizados, a empresa deve ter segurança da higidez de seus fornecedores.
Dessa forma, a transição para o novo modelo tributário exige planejamento estratégico e um acompanhamento contínuo da evolução normativa, permitindo que as empresas adotem práticas de compliance robustas e reduzam impactos financeiros adversos
3. Estratégias para uma Transição Segura e Eficiente
Diante da complexidade do novo modelo tributário, recomenda-se que as empresas adotem um planejamento estruturado para garantir uma transição eficiente. Algumas das principais estratégias incluem:
- Mapeamento do Impacto Tributário: Identificação dos efeitos da reforma sobre a carga tributária da empresa, considerando a natureza das operações e as especificidades do setor econômico.
- Atualização e Integração de Sistemas: Adequação de softwares fiscais e contábeis para garantir a correta apuração e recolhimento dos tributos no período de transição.
- Treinamento da Equipe Contábil e Fiscal: Capacitação contínua dos profissionais responsáveis pelo cumprimento das obrigações acessórias e pelo relacionamento com os órgãos fiscalizadores.
- Análise Contratual e Renegociação de Fornecedores: Revisão de contratos comerciais para assegurar conformidade com o novo regime tributário, evitando distorções na precificação de insumos e serviços.
- Consultoria Especializada em Planejamento Tributário: Contar com suporte especializado para estruturar um planejamento fiscal eficaz, otimizando a carga tributária e mitigando riscos de inconformidade.
A transição para o novo modelo tributário representa um marco na modernização do sistema fiscal brasileiro, trazendo benefícios como maior transparência e eficiência na arrecadação. Entretanto, a complexidade da fase de adaptação impõe desafios operacionais e estratégicos que não podem ser negligenciados.
Empresas que se anteciparem e implementarem estratégias robustas de adequação tributária estarão em vantagem competitiva, reduzindo impactos negativos e garantindo segurança jurídica em suas operações.