A eterna questão sobre regulação do mercado – Dr. Bruno Auada – GM online

São Paulo, 13 de abril de 2009

A eterna questão sobre regulação do mercado

Por Bruno dos Reis Neto Auada

Quase sempre coladas às crises econômicas, discussões sobre a necessidade de maior regulação estatal para o sistema financeiro ganham eco. Pela leitura dos artigos recentemente publicados, a vítima da vez não é aquele que até recentemente era considerado oráculo da economia global, Alan Greenspan (ex-Presidente do Federal Reserve, o Banco Central americano).

Alan Greenspan, no dia 23 de outubro de 2008, em testemunho perante o Congresso americano, admitiu que, em parte, errou ao acreditar que os bancos seriam mais prudentes em suas políticas de empréstimos, visando proteger os acionistas. Mais recentemente, no último dia 17 de fevereiro, Gordon Brown, primeiro ministro britânico, assumiu responsabilidades por não ter imposto maior firmeza na regulação do sistema financeiro local.

Aparentemente, os maiores defensores da economia de livre mercado vivenciam a crença de uma vida inteira ruir diante dos acontecimentos de uma crise sistêmica que já é considerada a pior de todos os tempos. Aliás, críticas ao liberalismo não faltam. O presidente da França, Nicolas Sarkozy, por exemplo, defendeu com unhas e dentes a criação de órgão internacional para regulação do sistema financeiro mundial durante a última reunião do G-20.

Dizer que a intervenção estatal é melhor do que o liberalismo é dar as costas para os fatos que aumentam ou diminuem a intervenção estatal. Quando uma crise sistêmica acontece, os ânimos intervencionistas do Estado tornam-se mais fortes, gerando aumento no volume da regulação no mercado. Já em momentos de bonança econômica, ocorre o inverso. De qualquer forma, independentemente da forma de regulação que se acredite ser a melhor, devemos ter em mente que sempre houve e sempre haverá alguma espécie de regra, seja estatal, seja privada.

Historicamente, a origem da regulação do mercado está na própria autorregulação. Nos primórdios do mercado americano, por exemplo, os negócios eram realizados a céu aberto, mais precisamente no local que posteriormente veio a ser conhecido como Wall Street. Esses negócios começaram a ganhar padronizações e regras básicas, ditadas pelos próprios negociantes, até que em determinado momento, talvez pela dimensão que ganharam os negócios ali realizados, o governo americano decidiu chamar para si a responsabilidade de ditar as regras sobre tais negócios. Posteriormente, o Estado deixou de ser o único player regulador, devolvendo ao mercado seu poder de autorregulação. Passou do liberalismo para o intervencionismo, voltando para o liberalismo.

Dessa evolução podemos concluir que a autorregulação seria uma espécie de concessão outorgada pelo Estado em favor do mercado (a qual no presente contexto seria o direito de ditar suas próprias regras). E como em uma concessão tradicional, caso o Estado entenda que o serviço está sendo prestado de forma não eficiente, poderá diminuir essa autonomia ou até mesmo suprimi-la, mediante modificação da legislação então vigente.

Como consequência do momento econômico mundial de até poucos meses atrás, o mercado estava funcionando com nível de regulação muito baixo (pelo menos nos mercados ditos mais desenvolvidos). Mas agora que o mercado está em colapso, ou seja, que a prestação do serviço de autorregulação está falha, a tendência é que o Estado diminua a amplitude da concessão, como aconteceu com a edição da Sarbanes-Oxley Act (lei que, em resumo, exigiu maior transparência às demonstrações financeiras das grandes corporações americanas depois de escândalos envolvendo gigantes como Enron e Worldcom).

Mas e depois que a calmaria vier? O que acontecerá com a intervenção estatal? Aliás, essa é a grande crítica que se fez à Sarbanes-Oxley Act (inclusive pelo próprio Alan Greenspan). Defende-se que passados os reflexos sistêmicos e restabelecida a normalidade, a regulação deveria ser revista visando flexibilizar as obrigações ali estabelecidas.

A briga entre liberalismo e intervencionismo nunca cessará. Prova disso é que as declarações como as de Alan Greenspan e Gordon Brown hoje soam como um pedido de desculpas ao mercado, até porquê a questão sobre a regulação do mercado parece já estar decidida: o Estado deve intervir no sistema financeiro. Mas imaginemos se elas tivessem ocorrido em meio ao grande crescimento econômico vivenciado até então (ou, ainda, se elas ocorressem após o trauma de crise atual passar), será que elas soariam como desculpas ou seriam entendidas como pura loucura?

(Bruno dos Reis Neto Auada – Advogado de Zilveti e Sanden Advogados em São Paulo)

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