Por Marcela Ruiz Cavallo
O investimento anjo não é novidade quando falamos em investimentos em startups, mas com a vigência da Lei Complementar nº 182/2021, o popular Marco Legal das Startups, a figura do investidor-anjo ficou mais regulamentada e mais segura.
Conceitualmente, podemos definir o investimento anjo como o aporte efetuado por pessoas físicas, em geral profissionais bem sucedidos, em empresas em estágio inicial. Uma característica fundamental desta modalidade de investimento é que o mesmo não possui como objeto apenas o capital financeiro, mas sim o investimento intelectual, em que o investidor anjo “empresta” o seu know-how à empresa, fornecendo apoio, experiência e conhecimento para impulsionar e fomentar as atividades da mesma. Popularmente, o objeto deste investimento é conhecido como smart-money.
Em contrapartida, o investidor-anjo faz jus a uma remuneração conforme seus aportes. Com relação a estes, importante ter em mente que o valor aportado não integra o capital social da empresa, tampouco configuram receita da sociedade.
Em síntese, o papel do investidor-anjo na startup consiste, justamente, na disponibilização do smart-money. O mesmo não é considerado sócio e não possui participação na administração da empresa. Ainda assim, em alguns casos específicos, juízes e desembargadores encontravam dificuldades em enquadrar o papel do investidor-anjo na sociedade, dúvida esta que, muitas vezes, surgia por conta do próprio teor do contrato que, apesar de denominado de “investimento anjo”, trazia elementos de outras modalidades de investimento em seu bojo.
Com o Marco Legal das Startups, as dúvidas tendem a desaparecer, uma vez que ele traz uma previsão expressa acerca desta modalidade de investimento, inclusive afastando a possibilidade do investidor por eventuais dívidas da startup. Tal previsão torna esta modalidade de investimento mais segura, permitindo que os investidores calculem os riscos antes de efetuar o aporte. Assim, não se aplica ao investidor-anjo a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica, trazendo segurança para seu patrimônio pessoal.
Tal proteção se aplica também às startups. O fato de o investidor-anjo não possuir participação societária garante que o controle societário permaneça com seus gestores, não podendo o investidor-anjo interferir na condução da empresa.
Com relação ao investidor, existem alguns aspectos práticos a serem considerados. O primeiro deles é que o investidor-anjo somente pode exercer o direito de resgaste do aporte após, no mínimo, 02 anos da data em que o efetivou, ou em prazo superior previamente estabelecido em contrato. O valor do resgate do capital aportado fica limitado ao valor histórico, devidamente corrigido pelo índice previamente estabelecido.
Outro importante aspecto é que o investidor-anjo faz jus à remuneração correspondente aos resultados distribuídos, em porcentagem previamente definida. Neste aspecto vale uma ressalva: por força da legislação, tal remuneração não pode ser superior a 50% dos lucros da startup.
Assim, tal modalidade de investimento é extremamente atrativa àqueles que pretendem investir com um certo risco, mas com excelentes resultados, quando o negócio prospera. O investidor que não possui interesse ou que apresenta impedimento legal para integrar o quadro societário de determinada startup encontra nesta modalidade de investimento uma excelente forma de obter ganhos através de empresas que entende promissoras.
Contudo, existem fatores que devem ser levados em consideração por ambas as partes, vez que a interferência, por parte do investidor-anjo, no dia-a-dia da sociedade, pode atrapalhar o desenvolvimento do projeto. O investidor, neste caso, deve exercer o papel de conselheiro, e não de sócio, e muito menos tratar os efetivos gestores das empresas como seus funcionários. Lamentavelmente, as principais disputas judiciais relacionadas a esta modalidade de investimento surgem justamente pela falta de compreensão pelas partes envolvidas de seu verdadeiro papel na startup.
Portanto, ao se optar por essa modalidade de contratação, é de suma importância que seja elaborado um contrato que delimite as responsabilidades de cada um, traga os exatos padrões da remuneração, pois um contrato ambíguo ou até omisso efetivamente pode ocasionar um grande problema no futuro.